domingo, 27 de fevereiro de 2011

A Branca de Neve no parque da frente.

E lá estava ela, no mesmo banquinho, todos os dias ao final da tarde. O seu cabelo sempre preso num coque frouxo. Sua mão esquerda sempre possuía uma caneta, a mesma que corria pelo pequeno caderno que a garota sempre trazia. A outra ficava caída ao lado de seu corpo.

Inapropriado chamá-la de garota. Seus olhos traziam uma maturidade e paz que só quem passou por algo pode trazer. Qualidades de um idoso brincalhão alojadas no corpo de uma garota.

E lá estava ele, sentado em uma mesa qualquer da cafeteria em frente, observando-a. Era tão repetitivo – uma rotina –, ele já sabia o que aconteceria. Uma pena que a distraída garota, não. Ela fecharia o caderno após uma hora e meia e seguiria para a cafeteria, onde pediria um café expresso enquanto ele pagava e ia embora.

Em um dia desses muitos, ele estava chorando. Sua vida estava tão bagunçada que a única coisa que ele acreditava era nela. Ele sabia que amanhã ela ainda estaria no banco, como o usual.

Ocasionalmente, ela levantou os olhos. Encarou o garoto e, segundos depois, desviou os olhos para o papel.

Ele resolveu que era hora de falar com ela. Não importava suas lágrimas e sua cara inchada e vermelha do choro.

Olá. ― Tentou.

Ela o olhou com os olhos curiosos de uma criança. ― Olá. A que devo a honra?

Ele se assustou com a formalidade. Bem, já faz um tempo que eu vejo você escrever.

E é a primeira vez que choras. ― Ela falou.

É... Bem. Paul. ― Disse, estendendo a mão para ela. Ela a apertou suavemente, mas fez uma careta.

O que foi?

Prefiro Rupert.

Mas meu nome é Paul. ― Disse o garoto, confuso. Sua voz ainda estava embargada, o que dava a impressão de um menino mimado e birrento.

Mas eu tinha pensado em você como Rupert. ― Disse ela, dando de ombros. Seu coque caiu e foi a única vez que Paul havia visto seus cabelos soltos.

Ela era muito pálida, mas não aquele pálido de doença. Sua palidez era saudável, tanto que ela estava meio corada. Havia pequenas sardas espalhadas pelo rosto e braços. Seus cabelos eram negros, e totalmente lisos. Ela tinha os olhos castanhos tão brilhantes, que mesmo as pessoas de olhos claros gostariam de ter os seus.
Parecia a branca de neve. Só que real.

Ele, pelo contrário, tinha cabelos de fogo e cacheados. Seus olhos eram azuis, mas ele era igualmente branco.

Que seja Rupert, então.

Claire. ― Disse.

É seu nome real?

A sua face entregou que não. ― Por que está chorando?

Só alguns problemas. ― Disse, sentando-se ao lado dela. Sentia-se como um intruso, acabando com a paz e a beleza que era vê-la escrever.

Mas ele não conseguia controlar. Precisava saber mais sobre ela.

Se fossem só alguns problemas você não estaria chorando. Disse ela, séria.

É.

Eles ficaram em silêncio por bons minutos.

Claire? ― Chamou.

Sim.

Qual o pior sentimento do mundo?

Ela deu uma risada gostosa de se ouvir. ― Eu não sei.

Como não sabe? ― Disse um pouco frustrado. ― Você é escritora, deveria saber.

Môbem, eu não sou escritora. Eu junto as palavras em histórias para me divertir. Eu rimo em poemas pra recitar para o espelho e depois rir. Isso não me torna escritora, nem poetisa. E a dor de cada um é diferente. Uns podem sentir o sentimento intensamente, outros só uma pontada deles. O pior sentimento do mundo é pra quem o sente, pra uns podem ser angústia, pra outros, decepção. Pode ser qualquer um. Eu já me senti culpada e triste por ter tido um relapso de felicidade. Entende?

Ela mais parecia uma mãe.

Sim. ― Disse. ― Porque Rupert?

Tu me lembras meu gato de infância, o Rupert. Ele tinha os pêlos da mesma cor que seu cabelo. Além do mais, eu me sentia bem naquele tempo. Sinto-me bem com você por perto.

Ele riu.

Claire... Isso quer dizer que somos amigos?

Claro! ― Disse ela, sorridente. ― Deve ser bom ter um amigo.

Você nunca teve um amigo? ― Perguntou. Seu tom de voz era de horror.

Claro que eu tive. Foram bons amigos. Tom, Alice, Lery, Jean, Pierre... ― Ela parou.

O que aconteceu?

Às vezes, Paul, amigos precisam deixar de ser amigos para seguirem suas vidas.

Ela deu um sorriso e voltou a escrever.

5 comentários:

  1. Adorei. E o que eu mais achei interessante e fiquei com uma imensa curiosidade: Qual o nome real dela? Adoro textos que deixam esses mistérios.

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    "Deve ser bom tem um amigo." Acho que é 'ter'.
    Beijos.

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  2. Ai Sofia, como você é uma fofa! Adorei o que você quis passar com esse texto, eu realmente concordo com você. Amigos precisam deixar de ser amigos para viverem, uma pena a primeira vista.

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  3. Uau, adorei o texto, parabéns! :)
    Me identifico de cima à baixo, principalmente da parte em que ela se parece com a Branca de Neve, sabe... heh. Eu bem que gostaria de ter a coragem dele.

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  4. Como eu te disse, esse é o melhor texto que já li seu.
    Adorei ele demais, e me orgulho MUITO por ter uma amiga escritora como você.

    Te amo, Sofas.

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